Hoje à tarde em um programa de
rádio conversava com um amigo sobre a perdas no mundo da música durante 2016.
Agora a pouco fui surpreendido pela notícia da morte precoce do cantor George
Michael aos 53 anos de idade.
George foi um astro do pop colecionando diversos hits e muitas polêmicas. Do Wham! a carreira solo,
Michael soube construir uma carreira solida, graças a beleza de sua voz e a seu carisma.
Os deuses da música devem mesmo ter escolhido 2016
para alegrar o olimpo, pois a lista de artistas talentosos que partiram neste
ano é bem extensa.
Imortal, ouviremos sempre as suas
músicas!
George Michael partiu no natal, seu último e derradeiro natal.
Eu hoje fiquei pensando como é difícil viver neste mundinho,
onde o marketing manda em tudo, parece ser a única ciência “certa” deste
planeta, anestesiando as mentes, endurecendo corações, e iludindo pessoas
diariamente com suas falácias.
Fala-se muito em prazer e
felicidade
Na busca incessante de ser
feliz... é a tal tirania da felicidade.
Meu filho, se puder fuja da escravidão do
prazer, não seja um idolatra ou
escravo dessa falsa promessa, pois o ser humano é naturalmente confuso, está sempre meio
perdido, porque enfim existem tantas coisas que não sabemos nesta vida (quase tudo), e por
isso mesmo somos inseguros...
Duvide sempre de quem se
diz muito bem resolvido na vida, deixe essas pessoas bem longe do alcance e
interferência de sua vida... São loucos no pior sentido, lobos avarentos, ou sem escrupulos.
Ouvi palavras mais fortes
hoje em uma antiga música...
“Love is the light
Scaring darkness away-yeah”
Lembrei
tanto de você enquanto trabalhava, com as minhas próprias indagações atrás da orelha.
Foi
como olhar o céu à noite e avistar estrelas caindo, cruzando a imensidão dos céus.
Carta 1 – “A verdadeira
desorganização do desespero”*, ou, quando a solidão doí muito...
Pequeno lord,
Aqui onde encontro-me agora, não tenho mais do que 8 metros
quadrados para expandir os meus sentimentos, as minhas convicções, as minhas
esperanças e tristezas. Mas veja meu filho, isso não é um lamento, ao contrário
é uma forma tênue de resistir aos botes ligeiros e rasteiros que vire e mexe
recebemos da vida. Se há algum proveito na dor é a compreensão de que na vida
nada é em vão, e a certeza cristalina de que tudo que plantamos um dia
semearemos de alguma maneira, quase sempre do modo menos esperado, diga-se.
“No dia em que fui mais feliz
Eu vi um avião
Se espelhar no seu olhar até sumir”...
Passo os meus dias praticamente longe do meu pequeno
apartamento, que é simples, porém já gerei um carinho por este meu canto, e
tudo melhora quando eu olho para a parede à minha frente e vejo o lindo quadro
que a sua mãe me presenteou no último dia dos pais, sim aqueles em que você
está em diversas fotografias desde do seu primeiro dia de vida até
recentemente.
De todas as fotos existe uma que me chama muita atenção, aquela
de quando você estava brincando no parque do Ibirapuera com seu rostinho
pintado de tigre, lembra?
Acho que foi no verão deste ano...
Você estava reflexivo, quieto e compenetrado, a sua beleza é
ainda mais notada por esses pequenos detalhes, você não poderia ser alguém
diferente, desde cedo apresenta uma certa maturidade para uma criança de três
anos e meio, isso sem deixar de ser um moleque safado e muito alegre e
desenvolto em suas relações com o seu pequeno grande universo.
Ao retornar do meu trabalho eu quase sempre chego feliz,
pois mais um dia foi vencido, apesar dos problemas – que continuarão a existir
– se não fosse assim não o chamaríamos de trabalho, não é verdade!
Um dia você
compreenderá melhor do que falo agora.
Quando aqui cheguei era inverno e de certo modo eu vivia um
autêntico cá dentro de meu ser. Os primeiros dias e as primeiras semanas não
foram exatamente o que denominamos de fácil, no entanto foi importante manter a
serenidade e a vontade de tentar compreender por quê a minha vida estava
passando por essa mudança drástica e de forma inesperada...
“De lá pra
cá não sei
Caminho ao
longo do canal
Faço longas cartas pra ninguém
E o inverno em Itapetininga é quase glacial” (licença poética)
Certo mesmo é que aos poucos a vida vai querendo me dizer
algo sobre a tempestade, e nunca se esqueça que só temos bonança quando
atravessamos um temporal daqueles devastadores. Tenho tido tempo para voltar a
escrever algumas linhas caóticas, dentro do meu estilo sem padrão definido, e
retornei ao meu prazer de pesquisar música, tendo escutado muitas músicas
antigas e novas, o que me move a bons sentimentos.
Nesse momento está tocando um clássico da música francesa,
sim a França da Torre Eiffel que você tão lindamente diz querer conhecer um
dia, a canção é Aline gravada pelo cantor Cristophe em 1965. Essa música
aparece em uma cena muito bacana do filme “Praia do Futuro” (BRA, 2012)
dirigido pelo cineasta cearense Karim Aïnouz e estrelado pelo ótimo ator Wagner
Moura, talvez o nosso melhor ator da atualidade por sua capacidade tácita de
encarnar suas personagens com profundidade, sempre deixando uma porta
entreaberta ao público para ser curioso a respeito de sua atuação, isso é no
mínimo fantástico para um ator que não teme a exposição dentro de cena,
certamente um dos elos fortes na carreira do Wagner.
Meu pequeno anjinho, foi pensando no verso da música de
Adriana Calcanhoto e Antônio Cicero – o filósofo que também é irmão da cantora
Marina Lima – que seu pai percebeu que poderia escrever longas cartas para você
durante este período de exílio forçado, é preciso entender que o nosso país
vive uma grave crise de liberdade, aqui a palavra exílio não é usada de maneira
vã.
Enfim achei bem prático e de certo modo poético a ideia, e
um dia se você desejar poderá lê-las.
Termino essa primeira carta com um poema do Ferreira Gullar
que nasceu no estado da sua querida mãe, espero que você goste do poema do
Gullar e depois do pequeno trecho que compus para fechar a narrativa.
Retratos
“Amigos morrem,
as ruas morrem,
as casas morrem.
Os homens se amparam em retratos.
Ou no coração dos outros homens”.
Ferreira Gullar
Piazolla me faz chorar copiosamente,
a vida me faz chorar de tristeza e alegria
porque lá no fundo
sem essa dor
eu não reconheceria
o milagre da paz.
Jonathas Nascimento
Fique em paz meu pequeno tesouro, brinque bastante e logo
estaremos juntos novamente.
“O
Brasil é uma República Federativa cheia de árvores e gente dizendo adeus”.
(Oswald de Andrade)
Sou do tempo das cartas, quando era necessário escrever de
próprio punho palavras que pudessem expressar sentimentos.
As palavras de Oswald de Andrade são mais profundas do que aparentam. Falam do quanto
o progresso e o mundo da indústria e do trabalho inverteram perversamente a
lógica e as razões mais essenciais da vida em sociedade. Em nome desse suposto
avanço aceleramos o tempo, vivemos correndo e quase nunca dizemos aos nossos
pares o que mais importa. As árvores cederam espaço ao concreto, roubaram
de nossas paisagens o verde, o colorido, o frescor da natureza transformando
tudo no árido concreto, erguendo prédios enormes, pintando o mundo
melancolicamente de cinza. Abriram espaço para os velozes automóveis,
adicionaram computadores em nossas rotinas e, aos poucos nos fizeram crêr por
alguns instantes que as pessoas poderiam ser substituídas por máquinas...
Sabe lá Deus em sua infinita sabedoria o quanto esse estado de
coisas nos aflige, pessoas dispostas a doar o que temos de melhor – a erguer
relações em outros patamares, sem a clássica divisão patrão e empregado, pobre
e rico, homem ou mulher...
Sim,
eu sei meu amigo que o mundo vira as costas a todos os teimosos incuráveis, Dom
Quixotes das esquinas que andam trôpegos pelas ruas e avenidas desta vida, sonhando
sempre sem perder de vista que a missão é árdua, e por isso mesmo estaremos
sempre atravessando desertos e encarando muitas vezes a cruel e costumas solidão.
Eis
Milton cantando a beleza do amor, a paixão por River Phoenix
Final de tarde. Num balcão empoeirado de um antigo bar ela ouviu uma
voz, a mexer e remexer sentimentos com a intensidade de uma garota adolescente.
Sozinha sob o olhar petrificado de um barman ela apenas bebia seu drink,
deixando claro que aquele era um ritual de retiro de seu espirito e alma. Um
abajur à meia-luz, o som da chuva vindo da porta e o poder daquela voz contando
uma história que poderia ser a sua.
Será que ninguém nunca se sentiu assim antes?
Veio um suspiro e o último pedido:
-Mais um drink e a minha conta, por gentileza.
Não houve uma lágrima sequer a macular aquele happening, porque uma
frase povoava sua mente:
Gene Wilder
partiu hoje, deixando este plano ainda mais sem graça e com menos humor (se é que isso é possível). Gene foi um ator inesquecível para toda uma geração em papeis
como Willy Wonka da primeira versão de "A Fantástica Fábrica de Chocolates", ou mesmo o atrapalhado Theodore Pierce de “A Dama de Vermelho”,
apenas para citar duas de suas inúmeras personagens cômicas.
A cena abaixo é nostálgica e permanece lúdica e
bela, e a canção virou um hino cult.
Amigos e amigas arregalem os
olhos e sintam que o ar até parece mais leve na cidade poluída e suja...
Pelas calçadas jovens e anciões passeiam, enquanto a criança
corre solta pela avenida fechada para os automóveis. Acho que até consegui ver
alguém sorrindo, foi discreto mas existiu.
E logo mais à noite todos estarão felizes pelo breve
sentimento de liberdade.
Cante Moz para todos nós enquanto a chuva avizinha-se pela janela da sala de estar.
Há na vida momentos de revolta, incompreensão e dos
questionamentos sobre porque precisamos atravessar tantas dores neste mundo.
Porém e, contudo, existem certezas que ninguém consegue arrancar de dentro de
nossas almas, e isso de uma forma ou de outra nos movem a seguir adiante...
Assistindo ao vídeo acima sobre os 40 anos do terrível acidente
sofrido pelo piloto Niki Lauda no GP da Alemanha de 1976 me veio à mente um
certo conforto, pois eu também sou feito de carne e osso, assim como o Niki, o
cara que me fez gostar de automobilismo.
Vou morar em outra cidade, minha vida ficou de ponta cabeça
de uma hora para outra, é claro que a crise econômica é apontada como a
responsável, azar de quem acredita que isso seja motivo o suficiente para
ferrar com as pessoas e as tratarem como um objeto que você muda de lugar a
qualquer hora e a seu bel prazer. Não reclamo, ainda estou empregado e vou
sobreviver a tudo na maior alegria, mas fico mesmo é pensando nas pessoas que
estão com suas vidas meio que paradas pelos erros dos políticos e empresários
do país. Não é fácil para ninguém, mas vamos recomeçando a cada não que a vida
nos diz...
O Lauda se apegou ao fato de não ter morrido naquele carro
em chamas, está vivo até hoje, carrega consigo as marcas da sua tragédia
pessoal, eu carregarei as minhas sempre, mas o afeto e o amor ainda continuam a
ser mais importantes, eles sim nos fazem acreditar que podemos sempre oferecer
o melhor para o mundo, mesmo que ele (o mundo) não esteja nem aí pra gente.
Quando Julie Elizabeth Andrews surgiu cantando The Sound Of Music
pelas belas montanhas de Salzburgo, na Áustria, ninguém imaginaria que 50
anos depois aquelas memoráveis cenas fossem recordadas pela própria
indústria cinematográfica.
Esse
longa lançado em 1965 continua encantando crianças e adultos, e suas adaptações para o
teatro continuam ganhando novas versões a cada nova temporada.
Aqui
a justa homenagem durante a cerimônia do Oscar de 2015, que curiosamente foi
apresentada pela musa deste blog.
Os navios estão a salvo nos portos, mas não foi para ficar ancorados que eles foram criados...
Todo dia é
um novo dia, é mais um na coleção daquilo que convencionamos chamar de vida,
caminho,
estrada. Olhando as duas capas de Face Value do artista Phil Collins, a
primeira de 1981 – seu primeiro disco solo, e a segunda de 2015, que marca seu
retorno a tal estrada depois de alguns anos recluso, solitário, vivendo
depressivo inclusive, remasterizando seu próprio trabalho, não pude me
esquivar: quantas vezes em nossas vidas não desejamos refazer algo, remasterizar
nossos pensamentos, sentimentos, atitudes, etc. É perfeitamente compreensível, pois revisitar
o passado retornar a aquilo que foi “sucesso” e também ao nossos “fracassos” faz
parte de um processo natural da vida e, de um jeito, ou
de outro isso poderá nos trazer uma sensação de vivacidade.
As
fotografias de Phil me fizeram lembrar de algumas coisinhas, umas fúteis de
menor importância e outras mais densas e dignas de reflexão neste 11 de junho.
Sempre gostei muito dessa capa, pois ela humaniza o artista, expõe sua face,
sua feição, suas alegrias, seus sofrimentos, suas frustrações. Mas não imaginaria que Collins refaria a capa um dia, o que apenas
me fez admira-lo por sua coragem em dobro.
Quando
lançou Face Value em 1981, o cantor, compositor, baterista e pianista tinha
exatos 30 anos de idade, ao relançar o disco em 2015 Collins estava com seus
64. Certa vez uma querida amiga me disse que nossas marcas de expressão são o
que temos de mais significativo para expor em nosso rosto e, se pensarmos que
hoje em dia muita gente prefere esconder suas linhas, ejetando química, ouro ou
outras drogas para disfarçar a idade, vamos logo pensar que o ser humano é
mesmo um fingidor, muitas vezes teimando em esconder o melhor que tem a oferecer.
Fato é que mesmo remasterizando aquela música, não a tocaremos como outrora, simplesmente
porque não somos mais os mesmos, o tempo passa e as experiências nos ensinam alguns
atalhos, alguns truques, isso chama-se reinvenção. Reinventar a si próprio dia
após dia, anos a fio, é certamente difícil, então muita gente tenta se esconder
atrás de uma aparência mais jovem, mas a juventude que é bela sem dúvida alguma
também é uma fase de inconvenientes, angústias bestiais, exageros, ansiedade,
dramas superficiais por vezes e certa complacência consigo mesmo, na juventude os outros sempre estão errados!
Olhando os
olhos do meu filho e depois para os meus próprios olhos – eu tendo a sentir que
a vida – essa constante alternância de altos e baixos sempre valeu a pena, e
pensar o futuro agora é bem diferente de outrora, provavelmente pela existência
dessa pequena vida que abrigo sobre o meu próprio teto, me forçando a ser
criança novamente, a brincar com tudo que faz referência a sua vida, a seu
pequeno grande e ainda inexplorado mundo. Assisto o seu crescimento na primeira
fila, ali no gargarejo porque ser pai é bem isso, sempre que acontece alguma
apresentação na escolinha, lá está o Gustavo procurando instantaneamente pelo
pai e pela mãe, pois ele precisa de segurança, de aceitação, desse amor
incondicional.
Não sei se
hoje eu sou melhor, ou pior do que antes, mas o que sinto é que não tenho mais
tempo e nem disposição de gastar energia reclamando, achando que aquilo ou isso
poderia ser diferente, sabe existem fatores mais essenciais e que não precisam
de tratamento dramático, quanto mais simples melhor, embora viver não seja exatamente tão simples assim.
E de repente
me lembro de uma canção do Beto Guedes intitulada Cruzada:
Não sei andar sozinho
Por essas ruas
Sei do perigo que nos rodeia
Pelos caminhos
Não há sinal de sol
Mas tudo me acalma no seu olhar
Não quero ter mais sangue
Morto nas veias
Quero o abrigo do teu abraço
Que me incendeia
Não há sinal de cais
Mas tudo me acalma no seu olhar
Você parece comigo
Nenhum senhor te acompanha
Você também se dá um beijo dá abrigo
Flor nas janelas da casa
Olho no seu inimigo
Você também se dá um beijo dá abrigo
Se dá um riso dá um tiro
Não quero ter mais sangue
Morto na veia
Quero o abrigo do teu abraço
Que me incendeia
Não há sinal de paz
E tudo me acalma no seu olhar
Você parece comigo
Nenhum senhor te acompanha
Você também se dá um beijo dá abrigo
Flor nas janelas da casa
Olho no seu inimigo
Você também se dá um beijo dá abrigo
Se dá um riso dá um tiro
E assim, 47 anos atrás alguém muito parecido comigo nascia na
pequenina Loanda, e de lá pra cá foram tantas histórias por esses caminhos do meu
deus, e se de alguma coisa eu sei neste mundo é apenas a desconfiança de
desejar e dizer ao Guti: faça sua vida valer a pena diariamente, sonhe o quanto
puder sonhar, nunca desista daquilo que julga ser importante, corra atrás
enquanto for jovem e depois se permita reinventar-se um pouquinho a cada novo dia e, por fim, nunca tenha medo de se olhar com honestidade no espelho e nas
suas fotografias, assim como bem fez o Phil Collins.
Eu continuo sendo um sobrevivente de mim mesmo...
O homem que a dor não educou será sempre uma criança...
Vitrola: Phil
Collins If Leaving Me Is Easy (Live) 2015 e Beto Guedes – Cruzada
Cena do longa de Jonathan Demme “Filadélfia” (1993), e música cantada pela voz imortal de Maria Callas, a combinação não poderia dar em outra coisa, a não ser em uma cena memorável.
Abaixo uma
resenha assinada por Bia Abramo em 1994.
"Filadélfia"
combate preconceito com didatismo e honestidade
BIA
ABRAMO
DA REDAÇÃO
"Filadélfia" não foi levado muito a sério pela crítica quando
entrou em circuito comercial. Foi agraciado com adjetivos como convencional e
preconceituoso.
O grande mérito do filme tem origem justamente no que foi apontado com seu
defeito principal. Jonathan Demme acertou na mosca em fazer um filme
"careta", que tem como recurso dramático básico uma das formas mais
caras e consagradas do cinema americano –o filme de tribunal. O fato é que
"Filadélfia" consegue tratar com justiça e de forma didática um
assunto espinhoso.
A luta do advogado homossexual Andrew Beckett (Tom Hanks, Oscar de melhor ator
em 93) para provar que foi demitido por ser soropositivo expõe os preconceitos
em relação aos gays, mostra o estigma relacionado a Aids e revela as
dificuldades que as minorias enfrentam para garantir os seus direitos básicos.
O didatismo –por cálculo ou por limitação estética–, funciona para atrair e
seduzir um público avesso ou mesmo simplesmente envergonhado. O segundo lugar
na pesquisa Datafolha (veja quadro nesta página) parece confirmar essa hipótese
–retirar um vídeo na locadora é um ato mais anônimo do que ir ao cinema para
assistir um filme que pode ser considerado "gay" no senso comum.
Outro truque eficiente de Demme foi a escolha de um ator negro (Denzel
Washington) para interpretar o advogado de defesa Joe Miller. É de sua boca que
saem algumas das frases mais duras (e uma das piadas mais bem-humoradas também)
sobre a opção sexual de Beckett. Só um negro –ou seja, também membro de uma
minoria– pode ser tão politicamente incorreto no país que inventou as patrulhas
da correção.
Claro que exibir uma pessoa (neste caso, o ator-símbolo do homem comum
americano) definhando de uma doença tão devastadora como a Aids proporciona
terreno fértil para pieguice e Demme não faz esforço combate isso. Mas é menos
importante do que a honestidade de mostrar.
Detalhe: a trilha sonora, com "Streets of Philadelphia", de Bruce
Springsteen (Oscar de canção), e por uma belíssima música de Neil Young é de
primeira.
Filme: Filadélfia
Produção: EUA, 1993
Direção: Jonathan Demme
Elenco: Tom Hanks, Denzel Washington, Jason Robards
Vitrola: Maria Callas - La Mamma Morta (Philadelphia - 1993)
Reza a lenda
que esse registro de Renato Russo e a sua Legião Urbana aconteceu durante a
passagem de som da banda para o show em Volta Redonda no Rio de Janeiro em 1990,
após uma chuva torrencial que quase ameaçou a realização do show. Então durante
a passagem de som Renato decide fazer um agrado ao público que já estava por
ali e não desistira apesar da chuva e manda a belíssima “A Whiter shade of Pale”...
Ficou legal
e até então eu não conhecia esse registro.
Ele descobriu algo de novo: o amor. Aos treze anos pela primeira vez sentia aquilo que faz a vida valer a pena.
Como um passe de mágica experimentou o aroma da fragrância do Jasmim e, percebeu que era o mesmo que exalava no caminho para a casa de sua Julieta. Mas Julieta na verdade chamava-se Sofia e, era uma jovem vinda de outra cidade para passar as férias daquele verão.
Era um verão escaldante, sol a pino, temperaturas causticantes. Tudo corria como outrora até que numa bela tarde seus olhos conheceram aquela garota loira, de olhos levemente esverdeados, esguia, com sardas, extremamente charmosa, corpo desenhado e de lábios bem carnudos. Seria a bela da tarde de Buñuel?
Essa foi a primeira imagem de Sofia que ele congelou em sua retina.
Ele não sabia muito bem como dizer – ou se – era realmente necessário converter aquela sensação trepidante em palavras. Seria possível traduzir um sentimento avassalador?
Passou os primeiros dias travando um embate surdo consigo mesmo. Seu maior adversário: a sua própria timidez.
No fundo sabia que era correspondido, pois o olhar perdido e, o sorriso radiante de Sofia não disfarçava que ali entre ambos havia um desejo mútuo.
Passaram três semanas em uma casa de veraneio junto a uma multidão de jovens e adultos. Naquela atmosfera às vezes febril era certo encontrá-los próximos fosse brincando, jogando conversa fora ou, até mesmo brigando por pequenas tolices da idade. A provocação e a sedução eram recíprocas.
Acordavam cedo e logo estavam seguindo o trajeto entre a casa e a praia. Os dois transformavam aquele trivial instante em uma espécie de jornada, uma autêntica exploração sensorial.
Durante as noites na hora de dormir a luz que irradiava da rua, iluminava os olhos dos dois apaixonados. Em seus sonhos aquele era o momento perfeito, quem sabe ali o primeiro e eterno beijo de amor.
As férias terminaram e Sofia retornou para sua cidade. A distância motivava aquele romance velado não consumado (será mesmo?).
Foram cartas e mais cartas meses a fio – enquanto “a realidade mais delicada e mais difícil, menos visível a olho nu” batia à porta dos dois jovens enamorados.
Assim como uma tela de Cézanne perdida em algum sótão empoeirado e ordinário, onde sua beleza não podia ser apreciada, o tempo tratou de estancar aquela irresistível aventura.
Após anos sem noticias ele a reencontrou em uma viagem a sua cidade. Sofia estava casada e era mãe de três filhos.
Observou que a sua juventude continuava quase intacta, e por alguns instantes não hesitou em colocar-se no lugar do seu marido, mas preferiu guardar as boas recordações de uma década e meia atrás.
Sofia era a lembrança mais gratificante de um verão em sua juventude, talvez o melhor verão da sua vida.