Passando alguns dias e noites com a minha avó paterna no hospital, nada mais justo a alguém que um dia me acolheu em sua casa com tanto carinho e cuidado.
Acho que conheci a minha vó em 1975, 76, quando ela tinha uns 54 anos, e ao contrário do que aquele fedelho com 6 para 7 anos pensava e achava em seu mágico universo, ela não parecia alguém velha assim!
Era muito comum naqueles anos incríveis, que qualquer adulto com mais de 40 anos aparentasse ser um ancião com muita rodagem e preste a bater as botas, deveras engraçado lembrar disso hoje em dia e, o que será que o meu filho pensa então sobre este ancião de cabelos já bem grisalhos?
Dona Raimunda, carinhosamente chamada de Dona Nenê, havia deixado a sua bela Fortaleza (CE) para encarar duas noites e dois dias de ônibus na estrada, eram os tempos em que a elite nacional
não queria ver todo mundo viajando de avião, bem isso não mudou muito é verdade, pois o Brasil é pródigo em preconceito social e acumulação de renda por uma nefasta minoria.
Enfim, a minha avó sempre fez parte da maioria, tendo uma vida difícil, viúva cedo precisou logo trabalhar muito duro para conseguir sustentar e dar educação aos seus dois filhos, que depois virariam três.
Sua visita aos filhos e netos na metrópole São Paulo, incluía um ritual divertido de pregar peças nos netinhos. Acho que ela se divertia muito, talvez até mais do que os cinco irmãos do clã Nascimento.
Funcionou, pois cá estou eu recordando de suas travessuras.
Olhando para ela agora em um leito hospitalar, consigo perceber que seu codinome sempre fez jus a sua maneira de encarar este mundo, com sua simplicidade e muito bom humor, o que incomodava de certa maneira muitas pessoas que não a conheciam a fundo.
Sua longevidade é ancestral, já que sua tia mais querida, Maria e sua mãe Cecília (um nome lindo) faleceram aos 97 anos. Tive o privilégio de conhecê-las e de vivenciar em loco o último ano da minha bisavó, encontrando-a em sua cama sem respirar numa manhã ensolarada de Setembro de 1989.
Quem quer viver para sempre?, pergunta Freddie nessa que é a canção tema do longa “Highlander – O guerreiro imortal” de 1986, no vídeo em um dos últimos shows de Freddie com o Queen.
Dona Nenê conheceu muitas pessoas neste último século, assistiu a muitos nascerem e perdeu as contas de tantas outras que partiram dessa dimensão. Não deve ser tanto agradável assistir a um desfile só de idas da sua turma inteira e mais um pouco, enquanto seu corpo teima em seguir em frente desafiando o inexorável tempo.
Talvez a sua receita de longevidade tenha vindo de sorrir mesmo quando tudo conspira contra seus desejos e razões, além de certa dose de um bom e retumbante deboche.
Em mais uma internação vai ficando evidente que ela se prepara aos poucos para se desconectar dessa vida, porém sem perder o riso e a leveza de sempre e, não vamos esquecer que ela é uma autêntica guerreira Highlander.
Queen – Who wants to Live forever
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