Sonzeira…Solos
de guitarra inspirados, boas lembranças!
Television
Marquee Moon
(1977)
(Edição
Revista Bizz de 22,Maio de 1987)
Malcolm
McLaren sabia que os "pais da matéria" estavam nos EUA. Foi lá que
ele buscou inspiração para que o movimento punk acontecesse - de forma
concentrada - na Inglaterra. O que seria do punk sem o despojamento dos N.Y.
Dolls, a demência dos Stooges, o antilirismo do Velvet e a agressividade do MC
5? E não foram só estas - todas elas, bandas extintas anos antes do punk - as fundamentais.
Nova York fervilhava de bandas que acabariam traçando os moldes do que viria
depois do punk. Eram as bandas new wave de Nova York e, dessas, a mais
importante, ao lado dos Talking Heads e dos Voidoids de Richard Hell, foi o
Television.
A história
deles começa com o grupo Neon Boys, fundado por Tom Verlaine (guitarra/vocais)
e Richard Hell (baixo/vocais) em 71. Richard Lloyd (guitarra) e Billy Ficca
(bateria) completavam o grupo, que alguns anos depois mudaria de nome para
Television. Hell saiu por volta de 74, e Fred Smith, ex-baixista da Blondie,
foi chamado para substitui-lo. Em 74, o TV gravou um single e em 77 eles
assinaram com a Elektra para gravar o "Marquee Moon", o primeiro LP.
Em meio à
avalanche punk em que a maioria das bandas fazia um som rápido e primário
(Ramones, Dead Boys) ou flertava com o pop (Blondie, Marbles), o Television
optava por uma linha musical mais elaborada, com melodias harmoniosas,
convivendo com ruídos e músicas longas que, ao vivo, se transformavam em verdadeiras
jam sessions.
O som do TV
remete a uma gama de referências musicais, que vão de Byrds a Neil Young, de
Doors a Velvet Underground. Não que o TV soasse como uma das bandas citadas.
Ela parecia querer ser todas elas ao mesmo tempo e um pouco mais.
A música de
"Marquee Moon" é leve em seus ingredientes e pesada em sua atitude.
Os instrumentistas não usam efeitos ou pedais. É rock'n'roll puro, de uma
fluidez impressionante. Verlaine e Lloyd formam uma das duplas de guitarristas
de rock que mais deram certo. Ambos solam, se alternam em riffs, bases e
harmonias. Ambas as guitarras - principalmente a de Verlaine - alcançam
sonoridades que às vezes parecem com guinchos, grunhidos e gritos. Ficca e
Smith formam uma cozinha "à francesa" leve, com toques jazzísticos,
sem abusos.
As letras -
todas de Verlaine - sugerem mais do que dizem, como na faixa de abertura
"See No Evil" ("Eu entendo tudo/ a destruição urge/ela parece
tão perfeita/eu vejo/eu não vejo nenhum mal"). As texturas sonoras são
molduras perfeitas para as letras, como na faixa seguinte, a balada
"Venus", em que Verlaine cai "direto nos braços da Vênus de
Milo". Em "Friction" o destaque vai para o solo esquizofrênico
de Verlaine, assim como na comprida "Marquee Moon" (que, aliás, tem
um belíssimo falso gran finale).
O lado B
começa com uma jóia, "Elevation" ("A última palavra/é a palavra
perdida/por que você não o diz então?"), onde o junkie Lloyd faz um solo
emocionante. "Guiding Light" (única co-parceria de Verlaine no disco
- com Lloyd) é mais uma balada que demonstra a sensibilidade harmônica de
Verlaine. Em "Prove It", a combinação de base sonora simples com o
caleidoscópio de images evocadas por Verlaine é mais uma vez perfeita. Em
"Tom Curtain", a última música do disco, outra magnífica combinação:
a voz chorosa de Verlaine relembra os anos passados, enquanto sua guitarra
estridente rola suas lágrimas mais amargas.
Nem o
Television (que acabou em 79) nem seus integrantes em carreira solo conseguiram
fazer um disco à altura de "Marquee Moon" (que na edição nacional
saiu com um ridículo carimbo de "punk rock" na capa). É este o disco
que prova que eles eram, instrumentalmente, uma das bandas mais integradas da
década de 70, e não há músico ou não-músico - de qualquer gênero - que, ao
ouvir o disco, não se convença disto.
Celso Pucci/Thomas Pappon
Vitrola: Television - Elevation
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