Esquecida
pelo tempo (como quase tudo no Brasil), a canção "Juvenília" do grupo
RPM pode ser classificada na categoria de músicas subestimadas por seu tempo.
Felizmente, esse
mesmo tempo é um antídoto capaz de redimir certos equívocos (mas não todos), e nesse
caso ouvir Juvenília na era Temer/Patos Amarelos enquanto olhamos para a
situação surreal na qual o país mergulhou (talvez afundou seja o termo mais
adequado) – graças sobretudo, as mãos preconceituosas e a ignorância latente da
nossa classe média (não poderíamos alterar para classe abaixo da média?); torna
essa missão quase que naturalmente óbvia.
A grande
questão, no entanto é saber se a juventude brasileira atual é capaz ainda de
interpretar textos, compreender contextos históricos, apreciar poesias, ou
mesmo uma simples letra de música que na época dava voz a um sentimento de não
pertencimento, estranhamento, insatisfação dos jovens daquele país que tentava
sair da UTI após duas décadas e meia de ditadura militar, sim a mesma que
tantos agora clamam para retomar o comando de um Brasil chafurdado na lama da
hipocrisia, injustiça social e desenfreada corrupção.
Aqui qualquer semelhança não é mera coincidência!
Aqui qualquer semelhança não é mera coincidência!
Cada qual
possui a sua própria resposta e motivos para elencar essa sequência infindável
de fatos reais, que por vezes supõe e beiram a irrealidade.
Mas enfim, as
frases que mais me pegam nessa síntese melancólica sobre um país seus desmandos
e consequentes desdobramentos são:
“Sinto um
imenso vazio e o Brasil/que herda o costume servil/não serviu pra mim”, ou
ainda, “Parte o primeiro avião/e eu não vou voltar/e quem vem pra ficar/pra
cuidar de ti/terra linda/sofre ainda a vinda de piratas/mercenários sem direção/e
eu até sei quem são, sim eu sei/e você sempre faz confusão, diz que não/e vem,
vem chorando/vem pedir desculpas/vem sangrando/dividir a culpa entre nós”.
Quem dera
Juvenília fosse apenas e tão-somente uma canção ingênua, uma modinha de uma
época já passada, um hit radiofônico que tivesse dado bastante dinheiro aos seus
músicos e produtores e pronto.
Não é esse o
caso, primeiro porque é uma bela canção, que passou sim, despercebida durante o
furacão RPM nos anos 80, época que tantos ainda insistem em denominar de
geração perdida (o que falar então dos dias atuais), e segundo por sua força
motriz residir exatamente no contexto histórico-político-literário de sua
letra.
E assim
seguimos cantarolando aqui e ali com o RPM, enquanto uma maioria esmagadora
prefere desafinar gritando a sofrência dos neos sertanejos, emergentes sociais
que tão bem representam uma elite que continua a ignorar a literatura, a arte,
a filosofia, a história, até porque para eles o que importa no final das contas
é mesmo o o trivial biombo status/dinheiro.
RPM - Juvenília
Nenhum comentário:
Postar um comentário