A
cena bucólica não descola da minha mente...
Andando
pela Paulista como alguém que paga suas penitencias em pleno rush, percebo ao
lado alguém falando ao telefone. O caminho é longo e a minha impressão é que
estou em plena sessão de terapia:
-Estamos
dormindo em camas e quartos separados, só eu sei como foi difícil este final de
semana! Ainda não contei para a mamãe, vai ser duro, mas é vida...
E
a cada quadra o drama parece aumentar, tento fugir apressando os passos, mas o semáforo
fecha e logo a voz reaparece:
-Não
deu certo, apenas isso, não sei explicar, não tentarei agora compreender nada,
nós temos um filho e com certeza ele será o mais afetado nisso tudo...
Nem
mesmo o barulho dos automóveis, das vozes ecoando pela avenida, nada me impede
de ouvir o drama. Enquanto isso olhando a frente assisto ao ballet de pés e
pernas apressados configurando uma dança impetuosa de beleza e desprezo.
Então
a voz cala-se, não chega ao começo da avenida, tombou no percurso, sucumbiu em
meio à indiferença latente das relações humanas do mundo digital, da tecnologia
do afastamento, do não envolver-se, do desapego fatal. Foi como ouvir o lamento de um blues, ou a cronica de um bom country.
Vitrola: Rolling Stones - Far away Eyes
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